"E.T. Extraterrestre - de Trazer para Casa"

Peça Teatral de Carlos Leite Ribeiro

(Peça teatral alta comédia)

 

A Laura, aproveitando da ausência dos seus patrões, convidou o seu namorado PINGA na TELHA para ir lá a casa jantar.

Mas por motivos imprevistos, o casal Da Pêra teve de regressar a casa mais cedo do que previsto, e, claro, o Pinga na Telha teve de se transformar num extraterrestre ...

Depois, ficaram frente a frente dois grandes vigaristas, tentando cada qual desmoralizar o outro.

Em determinada altura da história, o Fausto da Pêra debate-se com um grave problema familiar, pois tanto sua esposa como a própria filha, mostram um certo "fraquinho" pelo Pinga na Telha.

Entretanto a sua namorada Laura, também não desarma ...

 

ELENCO:

PINGA NA TELHA - 30 anos. O tal extraterrestre do planeta do Kanto, que fica entre o Sol e a Lua, e que um belo dia "aterrou" na varanda do Fausto da Pêra, por culpa da sua criada Laura.

Mostra-se muito convencido e não liga muito à esperteza dos outros ...

LAURA - 25 anos. A grande responsável pela "aterragem" do extraterrestre do planeta do Kanto em casa dos seus patrões. Depois ... bem depois ...

FAUSTO DA PÊRA - 50 anos. Famoso vigarista que na história vai tentar dar a volta ao seu mais jovem "colega” de profissão, Pinga na Telha. Só que não contava com as "paixonetas" de sua mulher e de sua filha ...

Adelaide da Pêra - 45 anos. Mulher do Fausto da Pêra e também colaboradora eficaz e interessada nos tenebrosos golpes que o marido dá. A certa altura da história, fica completamente "apanhada" pelo habitante do "outro planeta" ...

Manuela - 20 anos. A filha do casal Da Pêra. Vamos encontra-la numa fase já muito adiantada da sua tendência de "vigarista e amiga do gamanço", sendo a colaboradora mais activa e produtiva da actividade de seu pai. Também queria provar "o gosto do habitante do outro planeta" ...

E outros personagens …

 

"EXTRA TERRESTRE de trazer por casa !" - Carlos Leite Ribeiro

 

A cena passa-se numa rua principal da bela cidade de Lisboa.

Uma esbelta rapariga cruza-se com um homem ainda jovem e de bom aspecto ...

Pinga na Telha: - Olha, olha quem vem aqui:  a minha querida Laura ! Estás simplesmente sensacional ! olha lá, aonde é que vais "gatinha" ?

Laura: - Olha quem me havia de aparecer à minha frente: O Pinga na Telha ! ... oh malandro, por onde é que tens andado ? ai, ai que o dia vai-me correr mal …

Pinga na Telha: - Antes de mais, deixa-me admirar-te ... tu cada vez estás mais bonita, mais belaaaa, direi mais: estás um autêntico cântico à beleza !

Laura: - Deixa-te de lérias e diz-me por onde tens andado. Pela tua cara ... não me digas que tens estado "dentro das grades" ?

Pinga na Telha: - Eu dentro ? ... mas dentro de quê ? ...

Laura: - Ora, ora não te faças de parvo ... dentro da prisão, está mesmo a ver-se!

Pinga na Telha: - Olha que não te compreendo. Diz-me lá que conversa vem a ser essa de prisão?  Para teu governo, fica sabendo que eu tenho andado com muito juízo. Agora, o que eu mais preciso, é de uma moça para casar, e tu és a pessoa mais indicada, minha adorada Laura !

Laura: - Olha que eu estou quase a acreditar – quase mesmo a acreditar. Só que há três anos me disseste o mesmo, não te recordas ?

Pinga na Telha: - Há três anos ?! ... e eu disse-te isso ? ou melhor, pedi-te nessa altura em casamento ?! ... bem, tenho uma vaga ideia de que de facto, te pedi em casamento. Mas tens de compreender que eu nessa época era ainda muito jovem ...

Laura: - Então queres dizer que agora, já és um "homenzinho" e queres casar comigo. Não é assim, "amorzinho" ?

Pinga na Telha: - Pois claro que é assim, embora tu continues a ser muito "gozona". Porque será que és tão má para mim, que te adoro tanto ?

Laura: - Eu má para ti ? Não te compreendo "amorzinho" ? ...

Pinga na Telha: - Ainda não compreendi bem porque brincas com os meus sentimentos, pois tu sabes muito bem que eu te adoro, que te amo muito, muito ...

Laura: Por favor, Pinga na Telha, não te esforces tanto, pois eu tenho que me ir embora. Olha que ainda tenha que fazer umas compras no hipermercado.

Pinga na Telha: - Só te deixo ir embora se prometeres no Domingo saíres comigo.

Laura: - Isso é impossível, pois, os meus patrões vão sair nesse fim-de-semana e assim não posso eu sair. Como vês, estás mesmo com azar !

Pinga na Telha: - De facto, estou com muito azar. Olha lá, e hoje à noite, não podíamos encontrar em qualquer lugar ?

Laura: - À noite, todos os gatos são pardos e, como deves saber, eu nunca gostei desair à noite.

Pinga na Telha: - Estou mesmo a ver que tu não acreditas em mim, mas posso jurar que desta vez é mesmo verdade: eu quero casar contigo ! Não, não me faças essa cara, pois tu és a única mulher que me conseguia levar ao altar !

Laura: - És tão aldrabão, Pinga na Telha,  pois à minha colega Serafina, disseste a mesma coisa - não te lembras ?...

Pinga na Telha: É certo que eu disse isso, mas já foi à muito tempo. Além que o caso com ela, foi uma pura brincadeira, pois a sério, só contigo, meu amor !

Laura: - Pode ser que com "a verdade me enganes" ... mas não sei. É que eu também já estou "queimada", pois o Adalberto também me pediu em casamento e por fim casou com outra.

Pinga na Telha: - Deixa isso para lá, pois já passou. Sabes, Laura, aquele meu tio de quem te cheguei a falar ...

Laura: - Sim, sim lembro-me muito bem; aquele que tu me dizias que era muito rico ?

Pinga na Telha: - É esse mesmo, Laura ! olha, morreu a semana passada.

Laura: - E deixou-te alguma coisa de jeito ?

Pinga na Telha: - Pois claro que me deixou. Além de dinheiro, também me deixou umas terras e uns edifícios…

Laura: - Ah sim ? … Isso é muito interessante, muito interessante mesmo. Ele morava, segundo tu me dizias, para os lados de Leiria, não é assim ?

Pinga na Telha: - Mas que memória a tua, querida Laura, como tu te lembras tão bem !

Laura: - Olha lá, Pinga na Telha, esse teu tio deixou-te tudo para ti ?

Pinga na Telha: - Pois claro que me deixou tudo a mim. Sou o seu herdeiro universal. Olha, até me deixou parte do rio Liz !

Laura: - Tudo junto, deve somar uns bons milhões de euros, e, sendo assim, vou tentar acreditar em ti. Vou dar-te mais uma oportunidade. Oxalá que não seja só "conversa de bandido".

Pinga na Telha: - Olha, meu amor, tu podes confiar inteiramente em mim, assim como em todo o dinheiro que o meu tio me deixou !

Laura: - E tu já tens esses bens todos em teu nome ?

Pinga na Telha: - Sim, tenho, ou melhor, ando a tratar disso. Mas na a próxima semana já deve ficar tudo regularizado .

Laura: - Então, não te esqueças de regularizar tudo o mais rapidamente possível, pois os prazos podem prescrever e depois não temos esse dinheiro, que tanta falta nos vai fazer, para governar a nossa vida, melhor, as nossas vidas em comum !

Pinga na Telha: - Tens muita razão, mas agora diz-me quando é que podemos estar juntos, bem juntinhos, para combinarmos umas certas coisas. Quero dizer, para "afinar", digamos, as agulhas ?

Laura: - No Sábado aparece lá em casa e assim podemos jantar juntos, e, e...

Pinga na Telha: - E, depois ...?

Laura: - Depois, logo se vê. Os meus patrões nesse dia estão fora. Não te esqueças que é no Sábado à noite. Espero-te em casa dos meus patrões, está bem ?

Pinga na Telha: - Não me esquecerei, meu amor. Podes ficar descansada. Adeus, meu grande amor da minha vida, meu amor, meu "gatinha" linda !

Laura: - Adeus, meu "príncipe encantado". Até Sábado à noite, e não te esqueças que eu tenho um comerzinho feito a capricho à tua espera !

Pinga na Telha: - Ai um comerzinho caprichoso à minha espera. oh meu amor, podes ficar descansada !

 

( no Sábado seguinte, à hora marcada, Pinga na Telha dirige-se a casa dos patrões da Laura. Toca a campainha da porta, e ...)

 

Laura: - Lá estão a bater novamente à porta, já ouvi e já vou abrir ... quem é ? ...

Pinga na Telha: - Laura sou eu, o Pinga na Telha.  Abre a porta depressa antes que alguma vizinha me veja …

Laura: - Ah, és tu !

Pinga na Telha: - Pois claro que sou eu !

Laura: - Entra, entra. Olá querido, como está o meu amor ?

Pinga na Telha: - Estou óptimo, só com uma grande fome; uma autêntica fome de lobo.

Laura: - Mas eu já tenho o jantarinho pronto que deve de estar uma delícia.

Pinga na Telha: - Lá cheirar bem, cheira. O que faz aumentar ainda mais o meu apetite.

Laura: - Fiz uma canjinha e um bacalhau com todos.

Pinga na Telha: - Então vamos lá comer. Olha lá, onde estão os teus patrões ?

Laura: - Como já te disse, foram passear e só devem regressar amanhã à noite. Mas vamos lá ao que nos interessa mais neste momento, ou seja, o jantar. Senta-te aí nesse lugar onde habitualmente se senta o meu patrão. Agora diz-me amorzinho, queres primeiro a sopa ou o bacalhau ?

Pinga da Telha: - Tanto me faz, pois a escolher, queria-te a ti em primeiro lugar, Laurinha da minha alma !

Laura: - Já que assim queres, toma lá primeiro a sopa. Se por acaso estiver muito quente, assopra-a que ela arrefece.

Pinga na Telha: - Serás sempre a mesma. Olha lá Laura, já pensaste se os teus patrões chegassem neste momento, que desculpa lhe davas ?

Laura: - Nem quero pensar nessa hipótese, porque sei que eles só vão chegar amanhã à noite. Vamos mas é mudar de assunto e falar, por exemplo, naquilo que o teu tio te deixou de herança. Olha lá, já trataste de todos os papeis que faltavam para poderes receber a tal herança ?

Pinga na Telha: - Quais papeis ?! Há sim, os papeis ... não te preocupes pois está quase tudo pronto. Mas voltando ao assunto que estávamos a falar, o que é que tu dizias aos teus patrões se por acaso eles chegassem neste momento ?

Laura: - Dizia-lhes que tu eras o ...

 

(nesse preciso momento, ouve-se uma chave a rodar na fechadura e a porta a abre-se, e )

 

Adelaide da Pêra: - Estou mesmo danada ! com a perspectiva de um fim-de-semana divertido, tivemos que regressar tão estupidamente a casa. Que pouca sorte a nossa !

Sancho da Pêra: - Ainda bem que regressámos a casa, pois eu já há muito que estou aflito para ir à casa de banho!

Manuela da Pêra: - Eu logo vi, para ti, só uma casa de banho privativa. Se tivéssemos ido para o acampamento sempre gostava de saber como é que tu te ias arranjar. Mas por favor despacha-te depressa pois eu também preciso de ir lá.

Fausto de Pêra: - Vocês estão p`ra aí todos nervosos, mas foi a mim que roubaram o carro ...

Adelaide da Pêra: - Olha menino, o carro não era só teu, era nosso !

Fausto da Pêra: - Duvido, pois, pelo menos estava em meu nome.

Adelaide da Pêra: - Pois é, mas quando era preciso meter gasolina ou pagar a oficina, eu é que tinha de arranjar dinheiro !

Manuela da Pêra: - Ó papás deixem-se de discussões. Estou cheia de fome e desde que chegámos, só me cheira a Bacalhau.

Fausto da Pêra: - A mim também me cheira a bacalhau …

Adelaide da Pêra: - Já estava admirada que não te cheirasse, pois, tu estás sempre esfomeado. A mim é que não cheira mesmo a nada. Mas onde é que se meteu a Laura, a nossa criada ?

Fausto da Pêra: - A esta hora já deve de estar a dormir ...

Adelaide da Pêra: - Duvido que ela esteja a dormir, pois não a ouço ressonar. Laura ... Laura ...

Manuela da Pêra: - Com esses gritos todos a mamã ainda acorda toda a vizinhança !

Adelaide da Pêra: - Ninguém tem nada com isso pois estou em minha casa e grito quando muito bem quiser !

Fausto e Manuela da Pêra: - Em nossa casa, queres tu dizer !

Laura: - Chamou, minha senhora ?

Adelaide da Pêra: - Pois claro que te chamei. Olha lá, aonde tens estado ?

Laura: - Bem, tenho estado ali ... ali ... acompanhada por um ...

Adelaide da Pêra: - Não me digas que tens estado acompanhada por um ... um homem cá em casa ?

Laura: - Mas minha senhora, ele não é um homem, pelo menos um homem vulgar ...

Manuela da Pêra: - Estou a compreender, pois para ti tem de ser um homem, especial !

Fausto da Pêra: - Mas o que é que estás aí a dizer ? … não é um homem ?!

Pinga na Telha: - Boas noites a todos ! A Laura tem toda a razão, pois eu não sou um homem ! …

Fausto da Pêra: - Podes-me dizer por onde é que "este” entrou ? E tu dizes que não é um homem ?!

Laura: - Sabem, encontrei esta "espécie rara" na varanda da sala ...

Manuela da Pêra: - Na varanda da sala de um quinto andar ? Olha que é muito estranho, muito estranho mesmo …

Fausto da Telha: - Está mais que visto que é um ladrão; vou já chamar a polícia ...

Pinga da Telha: - Tenha muita calma, muita calma mesmo. Por favor não chame a polícia, senhor Fausto da Pera, que por sinal só tem bigode. Tenha muita calma, porque eu vou explicar tudo muito direitinho. Pois é, como a Laura diz, eu aterrei na sua varanda ...

Fausto da Telha: - Então você é um aviador ?!

Pinga na Telha: - Aviador ... aviador, não direi. Mas tenha um pouco mais de calma, que eu vou contar tudo. Entretanto dão-me licença que me sente neste sofá ?

Fausto do Telha: - Claro, sente-se à sua vontade.

Pinga na Telha: - Muito obrigado.

Fausto da Pêra: - Agora que já está comodamente sentado, peço-lhe que nos conte a história da sua vida, pois estamos, digamos, com muita curiosidade ...

Pinga na Telha: - É uma história muito difícil de contar. Viajava eu numa nave especial do meu planeta, quando em determinado momento ela se desintegrou e eu fui injectado dentro de um invólucro e aterrei (ou caí) na varanda da sua casa ...

Adelaide da Pêra: - Então você quer dizer que não é deste planeta ?

Manuela da Pêra: - Olha que pergunta a tua, mamã. Claro que ainda não notaste que ele não é deste planeta, mas nota-se muito bem !

Pinga na Telha: - Pois, pois eu não sou deste planeta, sou do planeta ... do planeta do Kanto (escrevesse com um Kápa) !

Fausto da Pêra: - Do planeta do Kanto ?! nunca ouvi falar em tal. Então onde fica esse seu planeta ? ...

Pinga da Telha: - Olhe ... fica entre o Sol e a Lua ...

Adelaide da Telha: - Quer então dizer que você é um ...

Manuela da Pêra: - Oh mamã, é um E.T. ! Vê-se mesmo que não estás a par destes modernismos !

Sancho da Pêra: - É tão engraçado ter-mos cá em casa um E.T.. Até me faz lembrar o ALF, o personagem daquela série televisiva. Olhe lá, sr. E.T. , você também gosta de gatos ?

Pinga da Telha: - Não, não gosto nada, mesmo nada de gatos. Mal por mal, prefiro os cães.

Adelaide da Telha: - Mas afinal, sendo assim, quem é que me diz o que é um E.T.,ou lá o que você estão p`ra aí a dizer ?

Manuela da Pêra: - A mamã tem toda a razão, pois no tempo dela, estas coisas não aconteciam, porque ainda não tinha sido inventados os E.Ts. !

Adelaide da Pêra: - Claro que não havia estas coisas esquisitas, por isso agora quero saber o que é ?

Manuela da Pêra: - Olha mamã, um extraterrestre, é um habitante de outro mundo ...

Adelaide da Pêra: - Ai credo, filha ! não me digas que temos cá em casa uma "alma do outro mundo" !

Sancho da Pêra: - Olhe lá, sr. E.T., além de gostar de cães, por acaso também não gosta de ossos ? É que eu tenho aqui o osso de uma perna de vaca ...

Pinga da Telha: - Eu gostar de ossos ?! Eu, comer ossos ?! O menino não deve estar bom da cabeça !

Manuela da Pêra: - O meu irmãozinho é mesmo estúpido. Então querias que um E.T. comesse ossos ?!

Sancho da Pêra: - Eu não sabia, por isso é que perguntei ...

Manuela da Pêra: - Pois claro que os E.Ts., não comem os ossos, pois estes são precisos para alimentar os cães para depois, sim, os E.Ts., poderem comer os cães bem gordinhos !

Fausto da Pêra: - Estou mesmo a ver que você está p`ra aí com muita fome ...

Pinga na Telha: - É um facto sr. Fausto da Pêra, estou mesmo esfomeado .

Fausto da Pêra: - Então ia agora um cachorro ?...

Pinga na Telha: - Com a fome que tenho, comia um ou dois, ou mesmo três cachorros. O sr. Fausto da Pêra, nem pode calcular a fome que eu tenho ! veja só que eu não como desde ... desde a última vez ...

Fausto da Pêra: - Sancho, vai ali a baixo ao canil e procura o sr. Manuel dos Cães. Escolhe meia dúzia de cachorros dos mais gordinhos e trá-los, que eu amanhã farei contas com ele. Mas toma atenção, não é preciso que digas a ninguém que temos cá em casa um E.T.

Pinga na Telha: - O sr. Fausto da Pêra deve estar enganado, pois não são desses cachorros que eu gosto ...

Fausto da Pêra: - Então, de quais são ?

Pinga na Telha: - São daqueles que se comem dentro do pão !

Fausto da Pêra: - Para mim, você pode comer os cachorros como gostar mais, com ou sem pão. filho, vai lá então buscar os cachorros.

Manuela da Pêra: - Olhe lá, sr. E.T., como é que você se chama ?

Pinga na Telha: - Eu sou o Pinga na Telha !

Manuela da Pêra: - Que nome tão engraçado!  E aonde é que este amigo E.T. vai dormir esta noite ?

Adelaide da Pêra: - Esta noite, o nosso convidado vai dormir no meu quarto, e na minha cama !

Manuela da Pêra: - Ah sim ? E aonde é que o papá vai dormir ?

Adelaide da Pêra: - É lógico que dorme aqui neste sofá-cama !

Fausto da Pêra: - O quê, será que ouvi bem, o E.T. vai dormir contigo ?! Tu deves de estar é maluca; um E.T., qualquer a dormir com minha mulher ?

Adelaide da Pêra: - Não sei quem é que está mais maluco ! Pois há tantos anos que ando a tentar ensinar-te a arte de bem receber visitas em nossa casa, e tu, nunca mais aprendes !

Fausto da Pêra: - Mas olha lá, o E.T., vai ficar no nosso quarto, ou por outra, só contigo na cama ? Não, não posso estar de maneira nenhuma de acordo ...

Adelaide da Pêra: - Oh homem, tu cada vez estás pior ! olha lá, tu não vês que ele não é nenhum homem ? É simplesmente um E.T. e, além disso, temos o dever de honrar as nossas visitas !

Fausto da Pêra: - Mas tens de compreender que sozinho e durante a noite ... compreendes, não compreendes ?

Adelaide da Pêra: - Não, meu marido, não compreendo mesmo nada. Nem sequer aonde queres tu chegar ...

Fausto da Pêra: - Apesar de não seres muito inteligente, tu sabes muito bem ...

Adelaide da Pêra: - Tu o que és é um perfeito desavergonhado, um homem sem categoria nenhuma ! Vê lá tu que, até de um simples E.T. desconfias !

Laura: - Mas, para evitar certas confusões, o E.T. bem podia ficar na minha cama, pois ela até é bastante larga ...

Fausto da Pêra: - Agora até estou plenamente de acordo aqui com a Laura, pois assim se evitava certas confusões. Quanto a mim, este amigo podia ficar perfeitamente com ela. Isto tudo para evitar certas confusões ...

Adelaide da Pêra: - Mas que parvoíce é essa ?! um E.T. desta categoria, como pode ficar no quarto de uma simples criada ?! Aonde é que isto já se viu ?!

Laura: - Como fui eu que o encontrei na varanda, parece-me que devo ter uns certos direitos sobre ele...

Adelaide da Pêra: - Cala-te ! é certo que foste tu que o encontras-te, mas só por isso, não quer dizer que ele seja propriedade tua. Tu tens cada parvoíce, Laura !

Laura: - Pois, mas também não é propriedade da senhora !

Manuela da Pêra: - Por favor não discutam. O E.T. é de todos nós, não é exclusivamente de ninguém, assim, proponho que ele passe a noite no meu quarto, pois a minha cama também é muito larga ...

Fausto da Pêra: - Vocês estão é todas malucas ! Ele pode ser um E.T., mas o certo é que é um macho, e vocês são fêmeas !

Adelaide da Pêra: - E o que é que isso tem ser macho ? És tão pouco inteligente que nem vês que ele é de outra raça ?

Fausto da Pêra: - Então, queres dizer que ele pode ficar esta noite no quarto da nossa filha ?

Adelaide da Pêra: - No quarto da nossa filha é que ele nunca poderá ficar ! Poderá ficar no mesmo quarto que eu ficar !

Fausto da Pêra: - Tu estás completamente doida !

Adelaide da Pêra: - Então tu pensas que eu não sei guardar bem a nossa filha ? Pois fica sabendo que sei guardar, inclusive de E.Ts. !

Fausto da Pêra: - Olhe lá, senhor, senhor ...

Pinga na Telha: - Pinga na Telha !

Fausto da Pêra: - É isso tudo, Pinga na Telha. Olhe lá, no seu planeta do Kanto, como é que vocês fazem ... fazem ...compreende, não compreende ?

Pinga na Telha: - Senhor Fausto da Pêra, o que me pergunta é assunto tão pessoal, tão íntimo que nem dá para explicar ...

Manuela da Pêra: - Pois é, papá, o sr. Pinga na Telha tem toda a razão: nem dá para explicar !

Adelaide da Pêra: - Claro, que só dá para exemplificar. Isto nem parece teu, Fausto. Tu, com essa idade, já devias de saber essas coisas !

Fausto da Pêra: - O melhor ainda é o E.T. ficar no quarto comigo e com o Sancho ...

Pinga na Telha: - Alto aí, essa é que não ! Tenha muita paciência sr. Fausto da Pêra, mas essa hipótese é que não. No meu planeta, o do Kanto, não é permitido dormirem machos com machos. Sabe, lá no meu planeta, não são permitidas certas confusões !

Fausto da Pêra: - Mas era só uma solução, digamos, para esta noite ...

Pinga na Telha: - Essa solução é impossível para qualquer habitante do planeta do Kanto. Peço mais uma vez que não me levem a mal, mas assim terei que me ir embora. Vou procurar outra casa, outros amigos que me dêem melhores condições de vida.

Fausto da Pêra: - O sr. E.T. não se precipite, tenha calma, pois, com calma tudo se pode resolver ...

Pinga na Telha: - Calma tenho tido. Só preciso é de boas condições de vida, como por exemplo, boa comida e uma boa cama...

Fausto da Pêra: - Mas eu já lhe disse que com calma, tudo se irá resolver ...

Adelaide da Pêra: - Estás a ver, Fausto o que tu estás a arranjar com essa tua mania de tudo quereres resolver ? estamos em risco de perdermos uma visita, um ilustre amigo, um E.T. !!!

Fausto da Pêra: - Vê lá se te calas e se me deixas pensar bem ...

Adelaide da Pêra: - Pensar bem e resolveres o quê ?

Fausto da Pêra: - A melhor maneira de resolver este problema. Tu tens cada uma !

Adelaide da Pêra: - Mas tu nunca conseguiste nem consegues resolver nada !

Manuela da Pêra: - A mamã também está a ficar muito chata. E se deixassem que o E.T. ficasse no meu quarto e na minha cama, o assunto ficava resolvido ...

Adelaide da Pêra: - No teu quarto é que nunca ! Tu minha filha, sabes lá quais são as intenções deste E.T. ? Tu ainda és muito novinha e ainda estás muito crua, para compreenderes estes assuntos ... de E.Ts.

Manuela da Pêra: - E a mamã o que é que percebe deste assunto ? diga lá ...

Fausto da Pêra: - Boa pergunta, minha filha ! Mas eu sou bem capaz de te responder por ela: É que a tua mãe está a ficar velha de mais para estes assuntos. Mas numa coisa a tua mãe tem razão: ainda não sabemos o que é que este E.T., ou seja, o sr. Pinga na Telha veio cá fazer ao nosso planeta.

Laura: - Se me dão licença, eu volto a insistir no sentido do E.T. (o sr. Pinga na Telha), ficar esta noite no meu quarto. Não vai haver qualquer problema, pois, eu porei um colchão no chão e ele pode lá dormir. Para um E.T., até ficava muito bem, e os vizinhos não teriam nada a comentar ...

Adelaide da Pêra: - Até aí tens toda a razão:, pois, os vizinhos não têm nada, mas mesmo nada a comentarem, pela simples razão de não saberem que o sr. Pinga na Telha, está cá em casa !

Laura: - Pois é, mas nunca se deve confiar em demasia, pois eles podem vir a saber, e depois, já sabem como é: um grande falatório !

Manuela da Pêra: - Não, não, com essa não nos convences. Sabes, é que nós também não somos assim tão ingénuos.

Adelaide da Pêra: - Manuela, minha querida filha, não dês conversa à criada, pois ela, coitadinha, não tem a mínima noção do que é a "Arte de Bem Receber as Visitas". Ela não tem culpa nenhuma, mas tem de compreender. Mas, no fundo, temos de a louvar pela sua coragem e grande interesse em tentar resolver este delicado problema.

Fausto da Pêra: - Olhem lá, por acaso não podem ficar um pouco, uns momentinhos caladinhos para que o nosso amigo E.T., nos possa contar o que é que veio cá fazer ao nosso Planeta ?  Vocês, por acaso, já pensaram que podemos estar na presença de um espião, ou de um sabotador, ou mesmo de um assassino, a soldo de uma grande potência inter-planetária ?

Adelaide da Pêra: - Oh homem, cala já essa boca e acaba com essas parvoíces. Tu sempre foste um grande exagerado; nem ao menos vês que o Pinga na Telha tem um ar tão simpático, um ar másculo, é muito educado e tem muita personalidade ...

Fausto da Pêra: - Pois é, pois é,  mas tu podes estar completamente enganada, pois nós só vimos caras e não vimos corações. Ele poderá ser muito simpático, e ser ao mesmo tempo um grande assassino. Tu já não te recordas daquele filme "O Assassino da Voz Meiga" ? Usa bem a cabeça, mulher, e pensa muito bem, pois continuo na minha, ou seja,  podemos estar na presença de um grande bandido, ou mesmo de um grande assassino !

Manuela da Pêra: - Oh não, eu também sou da opinião da mamã. O Pinga na Telha não tem aspecto de malfeitor.

Fausto da Pêra: - Podem ter muita razão, mas eu não me convenço sem que primeiro ele nos diga o que veio cá fazer ao nosso Planeta. Sim, que eu saiba, nenhum habitante cá da Terra foi ao tal planeta do Kanto, como o Pinga na Telha diz. É por isso que eu insisto em saber o que é que ele veio cá fazer ao nosso planeta.

Laura: - E com essa conversa toda, curiosamente e na vossa opinião, eu é que não entendo nada da tal "Arte de Bem Receber Visitas", e com mau exemplo, é o sr. Fausto da Pera quem está a desconfiar das intenções desta visita ! Por favor não se esqueçam daquele velho ditado que diz: "A quem bater à tua porta, pergunta só quem é e nunca quem foste"

Manuela da Pêra: - Bravo, bravo ! Ainda não tinha descoberto que a Laura era filósofa, mas lá certa razão, tem ela .

Adelaide da Pêra: - Sabes, minha querida filha, o teu pai com a idade tem vindo a perder muitas qualidades. Vê lá tu que ele dantes até era muito belo e inteligente ...

Manuela da Pêra: - O papá ?

Laura: - E com esta conversa toda, este pobre E.T. deve estar a morrer de fome.

Fausto da Pêra: - Eu não me sinto culpado dessa situação, pois até mandei o Sancho ir buscar uns cachorros, mas ele entretanto adormeceu. Reparem só como ele dorme que nem um justo, e nem a novidade de termos cá em casa um E.T. lhe vence o sono. Agora, francamente, nem sei o que lhe posso oferecer para o nosso convidado comer.

Pinga na Telha: - Ai que sono tenho eu … Atrevo-me a dar uma opinião: como não têm cá em casa cachorros, pode ser mesmo uns pregos (bife de vaca dentro de um pão) ...

Fausto da Pêra: - Nem isso temos cá em casa. Martelo, ainda temos, mas pregos é que não.

Adelaide da Pêra: - Oh homem, tu estás mesmo em crise de inteligência, o que o Pinga na Telha quer, não são pregos metálicos, mas sim, pregos de carne - bifanas - carne no pão !

Fausto da Pêra: - Eu duvido que seja assim, mas se é isso que ele quer, a Laura que prepare esses pregos, ou lá o que é. Mas continuo na minha, ele com certeza que não irá gostar disso, pois, no tal planeta do Kanto, são bem capazes de comerem outras coisas; talvez umas coisas mais exóticas ...

Pinga na Telha: - O sr. Fausto da Pêra, pode ter razão, mas p`ra agora, que a fome é negra, carne no pão serve muito bem. Bom, como já vos disse, a minha viagem foi muito longa, e quando assim acontece, o apetite aumenta muito.

Laura: - Olha lá, Pinga na Telha, queres também um prato de sopa ?

Manuela da Pêra: - Lá estás tu a meter a colherada onde não deves. Olha lá, na tua ilustre cabecinha, imaginas que um E.T. de categoria como este é, coma sopa ? Que falta de conhecimentos que tu tens deste assunto, Laura.

Fausto da Pêra: - Vamos lá ao que interessa neste momento, Laura, vai à cozinha fazer o que o sr. Pinga na Telha te pediu, e não te demores. Entretanto, ele vai-nos contar o que veio cá fazer à Terra .

Adelaide da Pêra: - Oh homem, és muito aborrecido, além de seres também muito, mas muito chato !

Manuela da Pêra: - E estás com vontade de continuares a insistir e papá, estás a tornar-te impossível !

Fausto da Pêra: - Poderei ser enfadonho, aborrecido, mas mesmo assim contínuo em insistir em saber o que é que o Pinga na Telha veio cá fazer ao nosso Planeta. Sim, eu tenho o direito em saber quem tenho hospedado em minha casa. Se ele não tem nada a esconder, que nos conte já o que veio cá fazer, e notem por favor, que eu também estou a defender a raça humana de um possível e eventual ataque de seres de outro planeta !

Adelaide da Pêra: - O sr. Pinga na Telha, tem de desculpar a insistência descabida do meu marido, mas compreenda por favor, pois é a chatice própria da sua idade.

Pinga na Telha: - Eu desculpo tudo, pois não tenho nada a esconder. Eu vim e este Planeta, em missão  de ...

Fausto da Pêra: - Parece que quer dizer em missão de sabotagem. Será ? ...

Adelaide da Pêra: - Já estou a ficar preocupada, pois não me diga que veio para assassinar alguém ...

Manuela da Pêra: - Ou será que veio em missão de roubar algum projecto de alta tecnologia ?

Pinga na Telha: - Nada disso, pois eu não sou nenhum sabotador nem nenhum assassino, e muito menos um ladrão ! Eu vim cá a baixo em missão ... em missão de trabalho. Melhor dizendo, vim em missão profissional ...

Laura: - Não me digas que estavas inscrito no Instituto Nacional de Emprego. Olha, entretanto toma lá estas sandes e este copo de vinho.

Pinga na Telha: - Muito obrigado, Laura. Mas como ia a dizer, na nave onde eu vinha e que se desintegrou, trazia uma equipa especializada, que vinha trabalhar para este Planeta ...

Fausto da Pêra: - E olhe lá, o que é que vinham cá fazer ?

Pinga na Telha: - Essa equipa de grandes especialistas, vinha construir ... vinha construir, a estrada marítima que de futuro ligará Lisboa ao Rio de Janeiro !

Manuela da Pêra: - Não me diga que cá na Terra não há que seja capaz de projectar e construir essa estrada ?

Pinga na Telha: - Creio bem que não, pois este trabalho obedece a uma grande especialização.

Fausto da Pêra: - Estou mesmo a ver que vocês foram contratados pelos USA, que quer meter o nariz em tudo!

Adelaide da Pêra: - Oh homem, exageras em tudo.

Fausto da Pêra: - Eu não estou a exagerar em nada, o que eu estou a ver é que eles querem apanhar tudo, e assim, prepararem-se para destruírem os poucos paraísos que ainda temos !

Manuela da Pêra: - Papá, não sejas tão pessimista, pois a estrada vai só vai ligar Lisboa ao Rio de Janeiro...

Pinga na Telha: - Isso será só a primeira fase, pois depois será para seguir até à Argentina !

Fausto da Pêra: - É o que eu digo, é o que eu digo. Os USA querem apanhar tudo. Vejam lá que nem a América do Sul e a Europa conseguem escapar à sua veracidade. Reparem que eles até foram contratar pessoal ao planeta do Kanto, quando podiam ter subsidiado cá uns quantos cursos de "Calceteiros Marítimos". Isto assim, não está bem; nada bem, pois assim não poderá haver progresso !

Adelaide da Pêra: - Acalma-te homem. Quando começas a falar, até pareces que engoles agulhas de gira-discos. Olha que talvez fosses bom para relatares jogos de futebol, pois nunca te calas.

Fausto da Pêra: - Não posso estar de acordo contigo, pois parece-me que não sou eu que nunca mais me calo. Neste caso, aconselho-te a olhares para um espelho antes de olhares para os outros.

Adelaide da Pêra: - Não lhe ligue, sr. Pinga na Telha. Eu vou já arranjar-lhe a sua caminha, no meu quarto, e assim poderá fazer um grande soninho, pois deve de estar muito cansado.

Fausto da Pêra: - Já te disse mulher para te deixares de fantasias, pois, este E.T. nunca ficará no nosso quarto. Isto é ponto assente, ponto único e ponto final e muda de parágrafo. Eu amanhã vou comprar-lhe uma casota com corrente, para de futuro, ele ficar aqui no hall !

Adelaide da Pêra: - Estou a ver que estás completamente doido, homem. Então tu, pensas que o Pinga na Telha é algum cão ? Francamente, essa ideia só podia ter saído da tua cabeça.

Manuela da Pêra: - A mamã tem toda a razão. Até parece impossível, paizinho que possas pensar assim do Pinga da Telha. Tu não tens é qualquer respeito pelo teu semelhante !

Fausto da Pêra: - Eu, o Fausto da Pêra, ser semelhante a um qualquer E.T. ?!  Vocês estão é todas doidas ! O sr. Pinga da Telha, vai ficar aqui neste sítio, pois eu vou comprar-lhe uma casinhota muito bonita, assim como uma coleira cheia de guizos.

Laura: - O sr. Fausto da Pêra tem cada uma ! Vejam bem, eu, o Pinga da Telha armado em cão, preso a uma casota e no pescoço uma coleira cheia de guizos ? Eu, nem quero acreditar naquilo que estou a ouvir !

Manuela da Pêra: - Estou a ver que te preocupas demasiadamente com este E.T., Laura. E gostava de saber porquê ?

Laura: - Pois preocupe-me e parece que com toda a razão, pois não se esqueça que fui eu que o encontrei lá fora, cheio de medo, de frio e de fome !

Adelaide da Pêra: - Em parte, tens toda a razão. Encontraste-o em minha casa, na minha varanda, portanto em propriedade minha; além disso, nunca te esqueças que és minha empregada.

Manuela da Pêra: - Muito bem, muito bem mamã - apoiado ! Estamos a ver que a Laura, neste caso, está a passar-se (e muito) das marcas.

Laura: - Pronto, segundo a vossa opinião, eu estou a passar das marcas ... mas, por favor, deixem-no ir embora, pois ele coitadinho, precisa de descansar. Será que vocês ainda não viram que ele está muito cansado ? Se não viram, é porque não têm coração !

Manuela: - Laura, então já não queres que ele fique no teu quarto ?

Laura: - Lá querer, queria ... Ainda não compreendi porquê não deixam ...

Adelaide da Pêra: - Ah, isso é que não deixamos, não. Repara só que, se o E.T. ficasse no teu quarto e se acontecesse alguma coisa, nós, os teus patrões é que seríamos os responsáveis !

Manuela da Pêra: - Pois é, Laura, tens de ter paciência pois estás fora da corrida para a conquista do E.T.. E tu papá, como vês, o Pinga da Telha só poderá ficar no meu quarto. Mas em minha opinião, ele como nosso convidado, é que devia de escolher em que quarto é que deseja ficar ...

Pinga na Telha: - Eu, com o cansaço e o sono que tenho, não me importo de ficar em qualquer quarto, com qualquer pessoa ...

Fausto da Pêra: - Assim é que é falar, meu amigo ! Olhe que já estou a sentir uma certa simpatia por si. Como este amigo diz, e com muita razão, não se importa de ficar em qualquer quarto. Aproveitando a sua boa vontade, ele vai ficar no meu - concorda ? ...

Pinga na Telha: - Isso é que nunca ! como já tive oportunidade de vos dizer, não posso ficar num quarto com um macho (desculpe-me qualquer semelhança), pois é contra todos os princípios do meu planeta - o do Kanto. Posso ficar em qualquer quarto que me destinarem, mas sempre acompanhado por uma fêmea !

Fausto da Pêra: - No planeta do Kanto poderá ser assim, mas em minha casa, de certeza que não o é. Cá em casa, não existe nenhuma fêmea para Extraterrestres !

Manuela da Pêra: - Papá, era só esta noite ... para mais, o sr. Pinga na Telha tem um ar tão pacífico, tão bonzinho, que até parece um anjinho.

Adelaide da Pêra: - Olha minha filha, eu acredito nessa, ele é tão anjinho, tão anjinho que até adormeceu aqui no sofá.

Fausto da Pêra: - Olha que ele até ressona. Vamos embora para ele dormir como vocês dizem : como um “anjinho”.

Laura: - Podíamos pôr o “anjinho”, perdão, o Pinga na Telha na cama do meu quarto ...

Fausto da Pêra: - Já te disse que isso está completamente fora de questão, pois o E.T. vai ficar aqui muito bem sozinho.

Laura: - Ai, coitadinho dele ...

Fausto da Pêra: - Vamos mas é tirar daqui o Sancho, pois como o E.T. diz, por tradição do planeta do Kanto, não pode dormir num quarto em que durma outro macho.

Manuela da Pêra: - Olhem para ele, que está a dormir tão bem. O Pinga na Telha é mesmo bonito, é um autêntico gatinho!

Adelaide da Pêra: - Mas ressona ainda mais forte que o teu pai ! Olha Laura, passa-me essa manta que está aí a trás de ti. Pronto, já está todo tapadinho. Dorme bem, Pinga na Telha (toma lá um beijinho) ...

Laura: - Olha que é preciso ter descaramento ! Olhe lá, porque é que a senhora  beijou o Pinga na Telha ?

Manuela da Pêra: - Não lhe ligues mamã ! Olha lá, eu também posso beijar o Pinuinha na Telha ? ...

Adelaide da Pêra: - Não, não minha filha, pois podias ficar contaminada com qualquer vírus do planeta do Kanto. Eu só o ...

Manuela da Pêra: - Mas a mamã beijou-o ...

Adelaide da Pêra: - Pois beijei-o ... mas sabes minha filha, eu já há muito que estou imunizada contra todos os vírus !

Fausto da Pêra: - Oh mulheres, deixem, deixem o homem, ou melhor, o E.T. dormir ...

 

( saiem todos do pé do Pinga da Telha. Algum tempo depois ...)

 

Laura: - Pinga na Telha, amorzinho, acorda ... sou eu, a Laura. Acorda, dorminhoco ...

Pinga na Telha: - Eh pá, deixem-me dormir ... não sejam chatos. Chatos ...

 

(nesse momento entra também a D.Adelaide ...)

 

Adelaide da Pêra: - Pois é, logo vi que estavas aqui, Laura. Tu, como todas as criadas, és muito curiosa. Vá, sai daqui, sai daqui depressa e vai-te deitar.

Pinga na Telha: - Mas que maçada esta. Como é que eu posso dormir com este barulho todo ?  Por favor calem-se. Ai que eu tenho tanto sono ...

 

(entra também a Manuela ...)

 

Manuela da Pêra: - Com tanto barulho, logo vi que vocês as duas estavam aqui ! olhem para ele coitadinho, coitadinho dele, o Pinga na Telha, que é tão pequenino e bonito, e não o deixam dormir - coitadinho !

Adelaide da Pêra: - Sempre gostava de saber o que é que fazes aqui, minha filha, pois uma ingenuazinha como tu, já devia de estar a dormir à muito tempo.

Manuela da Pêra: - Ora, ora vim ver o nosso amigo do outro planeta. Ver se ele estava bem tapadinho; é que os habitantes do planeta do Kanto, são muito sensíveis ao frio !

Adelaide da Pêra: - Mas para cuidar desse assunto estou aqui eu, e não preciso da tua ajuda e muito menos da ajuda da criada. Olhem lá, vocês as duas podem irem embora, pois eu sou mais do que suficiente para tomar conta de um E.T...

 

(entra o Fausto da Pera ...)

 

Fausto da Pêra: - Mas que barulho vem a ser este ? … Sempre gostava de saber o que é que vocês as três estão aqui a fazer, em pijama ? Desde que este E.T. chegou, acabou o sossego nesta casa !

Pinga na Telha: - Mas será que não poderei dormir esta noite ? Só me faltava esta situação. Por favor, vejam se não fazem mais barulho, para eu poder dormir.

Laura: - Olha lá, E.T., no teu planeta do Kanto, não são as criadas que tratam dos hóspedes ?

Pinga na Telha: - São as criadas, as patroas, as filhas, todas tratam bem os seus hóspedes, sobretudo quando eles estão a dormir.

Fausto da Pêra: - Deixem o Extraterrestre descansar, e vocês vão descansar também, pois devem se levantarem cedo para fazerem a fascina da casa. Eu ficarei aqui junto do nosso amigo ...

Pinga na Telha: - Por favor não se incomode, sr. Fausto da Pêra, pois eu fico muito bem sozinho. É que nós, os do planeta do Kanto, não gostamos de ficar acompanhados por machos ...

Fausto da Pêra: - Tenha cuidado com a língua … macho, eu ?  Acha mesmo que eu sou um macho ?

Pinga na Telha: - Pois claro que é. É um macho da Terra, assim como eu sou um macho do planeta do Kanto !

Fausto da Pêra: - Assim já compreendo, assim está bem, assim já aceito. Meninas, toca a andar já para os vossos quartos, e um bom resto de noite, sem pesadelos e sem sonhos, digamos, cor –de - rosa 

Adelaide da Pêra: - Tu não és um homem, és um cínico. Vamos embora …

Fausto da Pêra: - Agora que elas já se foram embora, vamos nós falar. Pinga na Telha, logo pela manhã irei comprar-lhe a casinhota que lhe falei, assim como uma coleira com muitos guizos ...

Pinga na Telha: - O sr. Fausto da Pêra vai comprar uma casinhota, coleira com guizos, para mim ?!...

Fausto da Pêra: - Olhe que para mim é que não é ! Eu não o quero cá em casa sem coleira e sem guizos. Tem de compreender, que não é por nada pessoal, é só para saber por onde você anda !

Pinga na Telha: - Mas eu nunca usei coleira ...

Fausto da Pêra: - Mas vai passar agora a usar. Assim como ficará preso à casinhota por uma grossa corrente de ferro.

Pinga na Telha: - Você deve estar completamente doido !

Fausto da Pêra: - Olhe que não me ofenda, olhe que está em minha casa ...

Pinga na Telha: - Estou em sua casa, mas quero ir-me embora. Quero ir-me embora e já. Abra-me a porta, pois eu quero sair !

Fausto da Pêra: - Daqui é que você não sai, porque, digamos, passará a ser o animal de estimação cá de casa !

Pinga na Telha: - Eu, animal de estimação ?!

Fausto da Pêra: - Terá comida de borla. De vez em quando poderá ir apanhar um pouco de sol, na varanda. Mas tome bem atenção, pois só terá esta regalia se portar sempre bem e com juízo. Caso contrário, tenho ali um grosso cinto de cabedal. Mas porque é que você está aos murros à sua cabeça ?

Pinga na Telha: - Eu devo de estar a sonhar - a sonhar !

Fausto da Pêra: - Não está, não, a sonhar: E para provar-lhe que está bem acordado, vou dar-lhe um beliscão...

Pinga na Telha: - Mas que é isso, para que me está a beliscar ? Cuidado ... ai, ai, que você está a magoar-me. Olhe que você deve de estar mesmo doido varrido, mesmo em último grau !

Fausto da Pêra: - Já o tinha avisado que tivesse juízo, agora vou buscar o cinto e vais ver como "elas" te vão morder. A culpa foi tua por não teres juizinho nessa cabeça, e também por teres uma língua muito comprida.

Pinga na Telha: - Deixe-se disso, porque eu ... porque eu ... estou muito doente. Tenho uma doença incurável e muito contagiosa ... se me bater, contagiarei toda a casa, todos os que aqui vivem; e depois morrem com esta doença que é incurável e horrível !

Fausto da Pêra: - Mas ... mas você ainda não me tinha dito que era portador dessa doença ...

Pinga na Telha: - Claro que ainda não lhe tinha dito, mas digo-lhe agora.

Fausto da Pêra: - Olhe lá, se eu por acaso o levar ao veterinário, ele não o curaria ?

Pinga na Telha: - Eu, ao veterinário ? Veja lá é como fala e se tem mais respeito pela raça ... raça extraterrestre !

Fausto da Pêra: - Talvez se você levasse umas injecçõezinhas , umas pomadinhas, uns xaropezinhos, uns supositórios ...

Pinga na Telha: - Supositórios ?! Olhe, ponha-os você. Esta doença não tem cura e é altamente contagiosa, tanto assim que fui mandado para este Planeta, para morrer e, não contagiar e meu planeta, o do Kanto. Repare, se eu estivesse em perfeitas condições físicas, não teria vindo para cá. Mas agora reparo, que o sr. Fausto da Pêra, também está a ficar contaminado !

Fausto da Pêra: - Não me diga isso, por favor. Eu, é impossível, é impossível ... eu contaminado ? Olhe lá, diga-me porque é que diz que eu estou contaminado com a sua doença ...

Pinga na Telha: - Porque vejo o sr. Fausto da Pêra a tremer, com suores frios, a garganta muito seca, dores de cabeça e é possuidor de uma grande ansiedade. Não tenha a menor dúvida, pois o senhor está (pelo menos) a ficar contagiado !

Fausto da Pêra: - De facto, já me estou a sentir muito doente, muito doente ...

Pinga na Telha: - Pois está, está a sentir-se muito doente, eu não lhe dizia ? Cada vez vai ficar mais doente, cada vez mais cansado, e depois ...

Fausto da Pêra: - Estou a sentir tudo isso que me está a dizer !

Pinga na Telha: - Pois é. Felizmente para o sr. Fausto da Pêra, a doença ainda está em fase de incubação e, sendo assim, ainda será fácil a sua cura. Isto se você estiver interessado.

Fausto da Pêra: - Pois claro que estou interessado ! Eu quero ser curado !

Pinga na Telha: - Então, terá de me abrir a porta da rua para eu poder sair ...

Fausto da Pêra: - E só por isso ficarei curado ?

Pinga na Telha: - Bem ... digamos que será o princípio da cura. Como deve de compreender, eu tenho que ir para muito longe daqui ...

Fausto da Pêra: - Então vamos já começar com a cura. Vou já abrir a porta da rua ... ... já está, e agora saia, saia, saia muito depressa, ouviu ? Vá para muito longe e não volte mais a minha casa. Nunca, nunca mais volte a minha casa !

Pinga na Telha: - Calma aí, sr. Fausto da Pêra. Muita calma e por favor não me empurre. Eu saio daqui, mas como já tive oportunidade de lhe dizer, tenho que ir para muito longe. Talvez até para outro planeta ...

Fausto da Pêra: - Vá para onde você quiser, mas saia, saia muito depressa de minha casa. Eu tenho muito prazer em o deixar sair e não participar a sua doença às autoridades sanitárias ...

Pinga na Telha: - Pois é, pois é, mas eu tenho de ir para outro planeta, e para tal preciso de muito dinheiro ... de muito dinheiro mesmo. O sr. Fausto da Pêra terá de compreender, que tenho de comprar as passagens, que não são nada baratas ...

Fausto da Pêra: - Mas eu não tenho dinheiro, ou melhor, não tenho muito dinheiro cá em casa.

Pinga na Telha: - Não tem muito dinheiro, mas, então,  quanto “cacau” que tem neste momento em casa ?

Fausto da Pêra: - Não sei bem, mas talvez uns duzentos e cinquenta euros...

Pinga na Telha: - Pois é ... duzentos e cinquenta euros, não dá para nada. Tenho de esperar cá em casa que o sr. Fausto da Pêra consiga arranjar dinheiro suficiente para eu poder-me ir embora. Tenho muita pena, mas entretanto vou contaminando todos cá em casa. Mas paciência ...

Fausto da Pêra: - Tente compreender, Pinga na Telha, você assim contaminado, não pode de forma alguma ficar cá em casa. Terá de ir-se embora. Eu cada vez me sinto mais doente, mais cansado e até já sinto febre ...

Pinga na Telha: - Olhe que assim pode morrer repentinamente, quase sem dar por isso. Eu gostava de o ajudar, como é que não sei, pois, o sr. Fausto da Pêra só tem cá em casa duzentos e cinquenta euros e, essa importância não dá para nada. Olhe lá, por acaso você não tem cá em casa outros valores, como por exemplo, ouro, jóias, pratas antigas, marfins, etc. ?

Fausto da Pêra: - Ouro, jóias ... pois claro que tenho. Veja bem como tenho a minha cabeça, com tantos valores cá em casa, e nem me lembrava. Talvez seja já a doença a minar-me. Mas felizmente que você me lembrou !

Pinga na Telha: - Sim, sim, o sr. Fausto da Pêra bem pode-me agradecer. Olhe lá, por acaso sabe em quanto estão avaliados esses valores ?

Fausto da Pêra: - Assim por alto, em mais de cinco mil euros...

Pinga na Telha: - Em mais de cinco mil euros?

Fausto da Pêra: - É pouco, não é ?

Pinga na Telha: - Bem, de facto é muito pouco. Mas enfim, vamos lá a ver o que podemos fazer.

Fausto da Pêra: - Mas não se esqueça que, além destes cerca de cinco mil euros em valores, também lhe dou os duzentos e cinquenta euros em dinheiro. Se entretanto, eu encontrar mais alguma coisa de valor, também lhe entrego. Só lhe peço que espere aqui enquanto eu vou procurar e buscar os valores. Cada vez estou a sentir-me pior ... este contágio de uma doença extraterrestre está a dar cabo de mim. Tenha paciência e espere mais um pouco ...

 

(o Fausto da Pêra retira-se e o Pinga na telha fica sozinho. Entretanto, vai falando consigo mesmo ...)

 

Pinga na Telha: - “Formidável !!! Eu nem quero acreditar, o Fausto da Pêra (que por sinal só tem bigode) vai entrar que nem um patinho ! ah, ah, ah, cinco mil euros cá para o rapaz. Esta noite vou ganhar bem !”…

 

(neste momento entra a sua namorada, a Laura ...)

 

Laura: - Com que então, o menino está a tentar vigarizar o meu patrão !

Pinga na Telha: - O quê ?! ah, és tu, pensava que fosse alguém !

Laura: - Olha lá, e eu não sou ninguém ?

Pinga na Telha: - Pois não. Tu não és ninguém, ou melhor, és o meu grande amor, o amor da minha vida, a minha querida Laura !

Laura: - Olha que eu não sabia que tu eras um grande  vigarista !

Pinga na Telha: - Eu, vigarista ? Isso é que não sou ! Posso ser um oportunista. Para mais, até estou muito doentinho ...

Laura: - De facto, nota-se que estás muito doentinho e em baixo de forma ... Seu grande vigarista sem vergonha ! Mas desde já ficas a saber que eu também quero ir-me embora contigo senão ...

Pinga na Telha: - Olha que neste momento é impossível. Mas depois, quando isto acalmar, venho buscar-te para casarmos ...

Laura: - Deixa-te de fantasias, porque eu faço questão de ir contigo, e por favor, nada de discussões. Senão eu sou bem capaz de te "arraiar a bronca" e dizer tudo ao meu patrão. Não me provoques.

Pinga na Telha: - Laura acalma-te por favor, pois eu amanhã ...

 

(neste momento reentra em cena o Fausto da Pêra ...)

 

Fausto da Pêra: - Pronto, já regressei. Consegui reunir todos os valores que tinha cá em casa. Mas agora reparo, que fazes aqui Laura ? A esta hora, ainda devias de estar no teu quarto a dormir.

Laura: - Pois é, mas como o sr. Fausto da Pêra sabe, o Pinga na Telha está ... está muito doentinho e, como tal, vim trazer-lhe um copo de água.

Fausto da Pêra: - Mas tens de ter muito cuidado em não te aproximares dele, pois podes ficar também contagiada como eu, de uma doença estranha que ele tem. Ai, cada vez me sinto mais doente, e também muito cansado. Esta doença está a dar cabo de mim ...

Pinga na Telha: - O sr. Fausto da Pêra, já sabe quanto mais depressa eu sair desta casa, mais possibilidades tem de cura total. Senão, o contágio pode atingir valores demasiadamente altos ...

Fausto da Pêra: - Olhe que você tem muita razão, Pinga na Telha, muita razão mesmo. Tome lá este saco, que já tem lá dentro todos os valores que eu encontrei cá em casa.

Pinga na Telha: - E onde está o dinheiro ?

Fausto da Pêra: - Veja que também se encontra aí dentro do saco.

Pinga na Telha: - Pois está, muito obrigado. Agora assine aqui este documento em que diz que me deu todos estes valores de livre vontade ... assim, está bem. Já agora diga-me, por acaso essa pulseira que tem aí no pulso, por acaso não é de ouro ?

Fausto da Pêra: - Ouro ? Por acaso sim é de ouro. Foi o meu pai quem ma deu ...

Pinga na Telha: - Então. Se não se importa, ponha-a também dentro do saco. E esse relógio, por acaso também não é de ouro ?

Fausto da Pêra: - Sim, também é de ouro e de diamantes de muitos quilates. Foi uma herança da minha avó. Particularmente tenho muita estima por este relógio.

Pinga na Telha: - Não há razão para ficar com problemas psicológicos por causa do relógio. Ponha-o dentro do saco que eu terei muito prazer em também o estimar !

Fausto da Telha: - Adeus relogiosinho ! vou ter muitas saudades tuas. Nunca pensei que o teu último dono fosse ... fosse um extraterrestre !

Pinga na Telha: - Bem, como não diz que não tem mais nada de valor cá em casa, creio que me posso ir embora.

Laura: - Eu também vou com o Pinga na Telha ...

Fausto da Pêra: - O que é que estás p`ra aí a dizeres ? Vais com o Pinga na Telha? Mas o que é que vais fazer com ele ?

Laura: - Vou com ele para ... para o poder tratar com muito carinho. Além de também estar muito interessada em estudar o modo de vida dos E.Ts., em especial dos do planeta do Kanto.

Fausto da Pêra: - Mas Laura,, tu sabes bem que a doença que ele tem, é muito contagiosa e até mortal ?

Laura: - Eu sei disso tudo, sr. Fausto da Pêra, mas vou sacrificar-me em nome da Amizade Luso-do-Kanto !

Fausto da Pêra: - Oh Laura, estou a ficar muito comovido. Bendito seja o teu sacrifício !

Pinga na Telha: - Mas Laura, tenta compreender, eu amanhã passava por aqui e levava-te comigo ...

Fausto da Pêra: - Olha lá Pinga na Telha, cá a casa é que você não vem mais ! Laura, a tua atitude é altamente louvável. É um gesto de uma grande e sublime grandeza, só ao alcance de pessoas magnânimas como tu ! Minha amiga, segue, segue o teu destino e, acompanha este amigo Extraterrestre que só veio ao nosso planeta para morrer de uma doença altamente contagiosa e mortal. Vai minha amiga, e cimenta ainda mais a Amizade Luso-do Kanto ! Adeus ...

Laura: - Estou muito comovida com as suas palavras, sr. Fausto da Pêra. Meu querido amigo, também um adeus. Peço-lhe que dê cumprimentos meus à D. Adelaide, a sua filha Manuela e ao seu filho Sancho.

Fausto da Pêra: - Em teu nome serão entregues esses cumprimentos.

Laura: - Agora, meu querido E.T., vamo-nos embora para o nosso planeta, ou seja, rumo ao planeta do Kanto!

Fausto da Pêra: - Cada vez estou mais convencido que vocês foram feitos um para o outro. Oxalá que tenham muitos filhos e que morram cheios de amor e de felicidade, um pelo outro. Você, Pinga na Telha, é um E.T., e a Laura passa a partir deste momento a ser uma verdadeira E.T.U.A. !

 

(os dois saiem de casa de Fausto da Pêra, enquanto sua esposa, a Adelaide, entra em cena ...)

 

Adelaide da Pêra: - Marido, eles já saíram ?

Fausto da Pêra: - Já sim, mulher. Uuffaa, que eu já estava a ficar, como se diz, noutro planeta !

Manuela da Pêra: - Os espertinhos pensavam que nos enganavam, a nós, papá !

Fausto da Pêra: - Aproveitando a "esperteza" deles, consegui "palmar-lhe" (roubar-lhe) a carteira, que por acaso até estava bem recheada. Além de ter “encontrado” no bolso dele, este anel que deve valer uns bons patacos ...

Adelaide da Pêra: - E eu no quarto da Laura, encontrei esta mala que também está bem recheada. Nunca pensei que ela tivesse tanto dinheiro cá em casa ...

Fausto da Pêra: - Olha que ainda bem que a Laura era poupada !

Adelaide da Pêra: - E dentro dessa mala, também encontrei estas pulseiras e estes fios em ouro ...

Manuela da Pêra: - Ai papás, com isto tudo, ainda fico com a consciência pesada.

Fausto da Pêra: - Não tens razão para ficares assim, pois "ladrão" que rouba ladrão, tem cem anos de perdão, e neste caso, até devemos de ter aí uns duzentos anos de perdão !

Adelaide da Pêra: - Mas com esta paródia toda, fiquei sem aquelas bugigangas que consegui trazer, “dolorosamente”, o ano passado de boutiques espanholas. Mas mereceu a pena as ter trazido. O Pinga na Telha, que tem a mania que é esperto, ao fim e ao cabo, também não percebe muito de metais preciosos!

Fausto da Pêra: - Vejam lá que eu também lhe tive de entregar aquela caneta, que parece que “achei”, mas não tenho bem a certeza, além do relógio que “encontrei” num pulso de um indivíduo no Metropolitano de Lisboa … tive que lhe entregar tudo! A propósito, onde está a pistola que o Sancho tirou ao Pinga na Telha ?

Adelaide da Pêra: - Não te preocupes, Fausto da Pêra, pois o nosso Sancho levou a pistola para o quarto dele, e, quando acordar entrega-te a arma. O nosso filho, a nós, não rouba nada !

Manuela da Pêra: - Paizinho, estou a ficar muito nervosa ...

Fausto da Pêra: - Então porquê, minha filha ?

Manuela da Pêra: - Estou a pensar que eles ainda vêm cá a casa reclamar estas coisas ...

Adelaide da Pêra: - Acalma-te, minha filha, pois o papá já vai resolver rapidamente esse assunto, não é Fausto ?

Fausto da Pêra: - Tens toda a razão, Adelaide, toda a razão. Olha, passa-me aí o telefone…

Manuela da Pêra: - Tu vais telefonar a quem, papá ?

Fausto da Pêra: - Já vais ver, minha filha. E toma atenção para começares a aprender certos truques ...

“... está, é da Polícia ? ... é uma denuncia anónima; tome bem atenção: O conhecido vigarista internacional, Pinga na Telha, procurado até pela Interpol, encontra-se nesta cidade e em companhia de uma perigosa mulher. Fazem-se transportar num carro vermelho, matrícula CAU-15-68. Cuidado, pois eles podem andar armados e como já sabem, são muito perigosos ... com licença”.

Manuela da Pêra: - Essa foi de mestre, papá ! E como é que sabes que eles levaram um carro “nosso” que o encontramos perdido numa rua ?

Adelaide da Pêra: - Pura dedução, minha filha, pura dedução. Mas vai aprendendo estes truques.

Manuela da Pêra: - E agora o que poderá acontecer ?

Fausto da Pêra: - É simples: a Polícia vai procurar prendê-los, pois, indivíduos como eles, são noviços à Sociedade, e não podem nem devem, de maneira nenhuma andarem p`ra aí à solta, a incomodar cidadãos pacíficos e honestos, como nós.

 

(nesse momento entra o seu filho, Sancho ...)

 

Sancho da Pêra: - Papazinho, o tal E.T. já se foi embora ?

Fausto da Pêra: - Já sim, meu filho. E até levou a criada, a Laura, com ele !

Sancho da Pêra: - Ainda bem que já se foram embora. Olha, toma lá a pistola que ontem à noite lhe roubei ...

Fausto da Pêra: - Tens de começar a aprender a falar, Sancho. Nunca se diz roubar, diz-se antes transferir ou palmar, etc.

 

(neste momento a filha reentra em cena, e...)

 

Manuela da Pêra: - Papá, papá, fomos roubados, fomos roubados ! indecentes, indecentes roubarem-me ...

Fausto da Pêra: -Estou surpreso ... e o que foi que eles roubaram?

Manuela da Pêra: - Todo o ouro que eu tinha escondido no forro do sofá do meu quarto. Indecentes ! Roubaram tudo, tudo. Tanto “trabalho” que tive, para nada. Lá se foi o meu “trabalho” de um mês !

Fausto da Pêra: - Vejam bem a quem é que nós demos guarida em nossa casa. Isto só visto, porque contado, ninguém acredita !

Manuela da Pêra: - Tanto trabalho que eu tive em "transferir" esses objectos, para outros virem roubar tudo !

 

(neste momento a Adelaide reentra em cena, e...)

 

Adelaide da Pêra: - Fausto, Fausto ... estamos desgraçados !

Fausto da Pêra: - O que é que ainda mais nos aconteceu, mulher ?

Adejada da Pêra: - Os diamantes que tínhamos escondido atrás do contador da água, desapareceram !

Fausto da Pêra: - Ladrões, bandidos, gatunos ! Aquele malandro do Pinga na Telha ...

Manuela da Pêra: - Não pode ter sido ele que roubou os diamantes, pois não saiu desta sala. O ouro, devia de ter sido roubado por ele, mas os diamantes, não ...

Adelaide da Pêra: - Se não foi ele, quem poderia ter sido ?

Fausto da Pêra: - Espera ... só se foi a ...

Sancho da Pêra: - A criada, a Laura !

Adelaide da Pêra: - Pois foi … Que grande ladra que nos saiu !

Fausto da Pêra: - Olha que dois se juntaram cá em casa, e nós, a recebê-los tão bem !

Sancho da Pêra: - E agora, papá ?

Fausto da Pêra: - Agora, ficamos em perigo de sermos procurados pela Polícia ...

Adelaide da Pêra: - Pensas que eles seriam capazes de nos denunciar, Fausto ?

Fausto da Pêra: - Infelizmente, temos de esperar tudo de indivíduos da laia do Pinga na Telha e da Laura !

Manuela da Pêra: - E agora, o que é que vamos fazer, papá ?

Fausto da Pêra: - Vou pensar, vou pensar ...

 

(Numa localidade perto de Lisboa …)

 

Laura: - Pinga na Telha, estou tão cansada. Estou farta de andar a pé. Ainda não compreendi a razão porque deixaste o carro naquele pinhal.

Pinga na Telha: - É simples, porque o carro já não tinha gasolina.

Laura: - Com essa é que não me convences. Roubaste o carro e agora, com receio de seres apanhado, deixaste-o ali, não foi ?

Pinga na Telha: - Olha que eu não roubo nada, mas mesmo nada, a ninguém. Eu simplesmente “encontrei” aquele carro abandonado, e...

Laura: - Encontraste o carro abandonado ?! ... A minha santa alma até está parva !

Pinga na Telha: - Sim este carro estava abandonado, pois ninguém estava lá dentro e, durante uns dias utilizei-o. Agora que já não tem gasolina, já não serve para nada. O carro que o  Fausto da Pêra nos “emprestou”, também não tinha gasolina.

Laura: - Não vale a pena discutir contigo. Como já te disse, estou muito cansada e com muita fome.

Pinga na Telha: - Só te peço um pouco mais de esforço, isto pela Amizade Luso-do-Kanto. Ali mais adiante, encontra-se um restaurante onde podemos almoçar e descansar um pouco. Depois temos tempo de procurar outro carro ...

Laura: - E vais comprar um carro com os valores que o Fausto da Pêra te “deu” ?! Tu tens a mania que és esperto, mas desta vez foste bem vigarizado !

Pinga na Telha: - Nisso tens toda a razão, pois só me deram bugigangas. Aqueles malandros enganaram-me  e bem. Vá lá uma pessoa confiar em ladrões e em vigaristas !

Laura: - Com que então querias cinco mil euros, não querias, meu rico menino ? Sempre enfiaste um enorme barrete, foste bem enganado !

Pinga na Telha: - Não tanto como tu julgas Laura, pois, no forro do sofá do quarto da Manuela, encontrei este saco cheio de objectos de ouro. Devem valor bem mais de cinco mil euros.

Laura: - Ai que grande vigarista que tu me saís-te !

Pinga na Telha: - Se não quiseres acompanhar-me, podes seguir o teu caminho, pois eu nunca consenti, nem consinto que me chamem nomes feios, como esse de vigarista.

Laura: - Não te zangues, pois nós até fomos feitos um para o outro.

Pinga na Telha: - Ainda tens muito que aprender, Laura …

Laura: - Mas já sei algumas coisinhas. Talvez até me inspirasse contigo, meu querido, ou talvez não ...

Pinga na Telha: - Porque é que estás a ficar tão misteriosa ?

Laura: - Sabes, é que eu também "encontrei" em casa do Fausto da Pêra, atrás do contador da água, este saquinho cheio de diamantes. Como vês ...

Pinga na Telha: - Oh sua ladra, isso faz-se ?! Até parece impossível. Eu nem quero acreditar, pois tinha-te na conta de uma pessoa honesta, até de uma boa pessoa ...

Laura: - E eu não sou boa ?! ...

Pinga na Telha: - Se és boa ? és cá uma gatinha boazona ! Mas com isto tudo, chegámos ao restaurante. Eu também me sinto muito cansado e cheio de fome. O passeio a pé, também me abriu o apetite.

Laura: - Mas precisamos de ter muito cuidado, pois ainda estamos relativamente perto da casa do Fausto da Pêra, e ele pode vir aqui procurar-nos.

Pinga na Telha: - Oh, Laura, nesse aspecto tem calma. Ainda tens muito que aprender.  Vá lá, vamos entrar no restaurante e verás como se faz …

 

(Entram no restaurante …)

 

Empregada: - Bom dia. Vêm almoçar ?

Pinga na Telha: - Sim, claro, que vimos almoçar. Mas antes diga-me onde está o telefone ?

Empregada: - Está ali naquele canto.

Laura: - Olha lá, Pinga na Telha, para quem vais tu telefonar ?

Pinga na Telha: - Já vais ver e tenta aprender, Laura ...

“...é da Polícia ? ... é para uma denúncia: "o perigoso gatuno Fausto da Pêra, encontra-se num apartamento da rua da Água Pluvial, nº 16 - 5º F.. O perigoso bandido está acompanhado de uma perigosa quadrilha e estão todos armados" ... com licença”.

Laura: - Olha lá, Pinga na Telha, tu tiveste a pouca vergonha e coragem de denunciares o Fausto da Pêra ?!...

Pinga na Telha: - Pois claro que tive ! Assim, já não nos pode incomodar mais. Agora é que podemos almoçar descansadamente, e com a consciência que praticámos uma boa acção, ou seja, ter-mos denunciado uma perigosa quadrilha de gatunos !

 

(nesse momento entra  em cena dois ladrões …)

 

Ladrão: - Mãos ao ar ! olhem que isto é um assalto, por isso nada de espertezas. E comecem já a pôr todos os vossos valores em cima das mesas. Tu aí, abre a caixa do dinheiro, e já, antes que eu comece p`ra qui aos tirinhos. Tu, Nito, vai às mesas recolher todo o dinheiro e todos os valores. Vocês aí, deitem-se no chão e muito juizinho, senão ... se já recolheste  tudo, vamos rapidamente embora, vamos ...

Laura: - Chamem a Polícia, chamem a Polícia ! não deixem os gatunos fugirem ! ...

Empregada: - Já dei o alarme. A Polícia não deve tardar aí ...

 

(Entram dois polícias …)

 

Polícia: - Então os bandidos já saíram e alguém os reconheceu ?

Empregada: - Não, ninguém os reconheceu. Levaram todo o dinheiro que eu tinha na caixa, assim como também o dinheiro dos clientes e também os seus valores.

Polícia: - Pois é. Foi um golpe muito bem organizado. Isto cheira-me a Fausto da Pêra ou mesmo a Pinga na Telha. Ou quem sabe, talvez a ambos.

 

(À porta do restaurante …)

 

Laura: - E assim ficámos com os bolsos a abanar sem uma única moeda.

Pinga na Telha: - Com tantos bandidos à solta, que ninguém diga que está bem. Vê lá tu, Laura, a nossa pouca sorte !

Laura: - O que vale é tu ires herdar a grande fortuna que o teu tio te deixou, incluindo parte do rio Liz ...

Pinga na Telha: - Pois é, pois é ... só que esse tio morreu ... há mais de vinte anos !

Laura: - Oh seu grande mentiroso, seu grandíssimo mentiroso, seu grande vigarista ! A minha grande vontade era torcer-te o pescoço ... Mas, com a fome que tenho, nem força tenho para isso !

Pinga na Telha: - Ainda bem que estás fraquinha, pois senão, ainda ficava com o meu rico pescoço torcido !

Laura: - Olha lá, Pinga na Telha, e agora sem dinheiro, o que vai ser de nós ?

Pinga na Telha: - Também estou muito preocupado com o nosso momento presente. Sabes, tive uma grande ideia : este restaurante precisa de pessoal para a lavagem da loiça ...

Laura: - Não é muito do meu agrado, mas terá de ser ...

Pinga na Telha: - Então vamos lá até arranjarmos outra coisa melhor. Temos lavar loiça sem a partir …

 

F I M

 

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