J O A N A
Carlos Leite
Ribeiro
Naquela cama de um hospital,
agonizava uma adolescente.
Quem a tivesse conhecido,
com certeza que naquela
altura não a teria
reconhecido: cabelos
rapados, tubos no nariz e na
boca ... era um farrapo
humano, aquela que ainda há
pouco tempo era uma linda
menina.
Tudo começou quando os pais
se divorciaram. A mãe,
começou então a conhecer
amigos e amantes.
A Joana, que na altura era
estudante, começou a ter da
parte da mãe uma liberdade
que até aí nunca tivera.
O pai talvez não fosse
grande coisa, mas impunha
ordem e respeito.
À mãe da Joana, convinha
esta liberdade que dava à
filha, pois assim, podia
andar na vida amorosa que,
secretamente, sempre
desejou.
A Joana começou a andar com
"amigos"; começou a ir a
muitos "trabalhos em grupo";
começou a drogar-se; começou
a ter sexo ...
E a doença do século, a
Sida, tomou conta do seu
belo e promissor corpo e do
seu belíssimo rosto.
Quem a viu e quem a vê:
cabelo rapado, tubos na
nariz e tubos na boca ...
Pensou na mãe. Talvez quando
soubesse da sua morte,
filosoficamente pensasse: "A
minha filhinha não teve
sorte nesta vida". E, com o
seu grande poder de
auto-desculpa, continuasse a
pensar: "Se ela fosse como
eu, ainda hoje estaria viva
- a culpa foi dela !".
A morte aproximava-se de
Joana. Revoltou-se.
Tinha vivido demasiadamente
depressa a vida, mas nunca
soube o que era o seu lado
bom. Agora estava prestes a
extinguir-se. Não, Joana não
queria morrer, queria ser
feliz. Desejava ter filhos
para um dia poder
transmitir-lhes a sua
dolorosa experiência.
Desejava ter filhos para os
poder educar, para mais
tarde eles poderem ser os
"espelhos" da sua própria
vida.
Entretanto, Joana morreu ...
...
Quase milagrosamente, após a
sua morte, as belas feições
de Joana apareceram
novamente.
Parecia que sorria.
E talvez sorrisse ...
Talvez o Senhor Bom Deus, na
sua infinita bondade lhe
tivesse segredado que
contava com ela, no Dia do
Juízo Final ...
Conto de Carlos Leite
Ribeiro - Marinha Grande -
Portugal
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